Quem foi Benjamin F. Newton?

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Foi anunciado pelo site Deadline que o ator Matt Lauria (Kingdom, Friday Night Lights) entrou para o elenco da websérie Dickinson, que deve estrear ainda este ano. Lauria vai interpretar Ben Newton, descrito no press release como “um belo funcionário do pai de Emily. Ben tem uma qualidade ‘de outro mundo’ quando comparado à população de Amherst. Ele tem uma sensibilidade incomum entre os homens de seu tempo, o que permite que ele e Emily desenvolvam uma conexão mais profunda”.

Na vida real, Dickinson conheceu Benjamin F. Newton quando ela tinha 18 anos. Aos 28, ele era um jovem advogado começando sua carreira no escritório de Edward Dickinson, pai de Emily. Embora especule-se a respeito da natureza do relacionamento dos dois, é fato reconhecido que Newton exerceu uma influência formativa sobre Dickinson, a introduzindo à obra de Wordsworth e Ralph Waldo Emerson. Ele também foi a primeira pessoa que a incentivou a levar sua escrita a sério. A biógrafa Lyndall Gordon escreveu sobre esta amizade em Lives Like Loaded Guns (2010). Traduzi alguns trechos para compartilhar aqui:

Benjamin Franklin Newton, de 28 anos, era dez anos mais velho que Emily. Como leitor, ele estava em contato com “as Sombras” – o suficiente para Emily lhe confidenciar um pouco da sua própria vida literária e aceitar a orientação de Newton em suas leituras. Durante 1848-49, ele tornou-se seu mentor, com Emerson como um dos tópicos mais comuns entre eles.

Emily havia testado a crença de Emerson na “integridade da mente privada” em Holyoke. Conscientemente ou não, ela havia se demonstrado um modelo de autoconfiança emersoniana. Ao longo da sua provação, ela resistiu ao puritanismo entranhado (reanimado por Jonathan Edwards na contramão do otimismo do Unitarismo quando esta fé dominou Boston no século XVIII). Como um unitário e entusiasta de Emerson, Newton podia compreender a revolta particular de Emily contra o dogmatismo. Como mentor, ele teria reforçado as suas declarações privadas de independência espiritual – “perversas” nos termos puritanos locais. (p. 60-61)

Newton, agindo na prática como um emissário de Emerson para a inexperiente Emily Dickinson, a incentivou a se tornar uma poeta. Ele falou com o eu secreto dela, não numa forma sedutora como Rochester, mas como uma voz da experiência, então ela acabou cedendo, com protestos de deferência à sua sabedoria. Após Newton deixar Amherst para abrir um escritório em Worcester, Massachusetts, ele passou a escrever para ela. De início, os pais de Emily botaram um freio no lado dela na correspondência: ela não devia escrever por pelo menos três semanas. Quando esse prazo acabou, ela confidenciou a Jane em janeiro de 1850, “Vou escrever”. (p. 63)

Nada foi preservado da correspondência com Ben Newton. No entanto, temos acesso a uma confidência extraordinária em uma carta para Jane Humphrey de abril de 1850, insinuando uma “alegria” divina:
“Eu ousei fazer coisas estranhas – coisas ousadas, e não pedi nenhum conselho a ninguém – eu dei ouvidos a belos tentadores e não acho que estava errada… Ah, Jennie, me aliviaria te contar tudo… e confessar o que só você deve saber, uma experiência amarga, e doce, mas o doce me seduziu – e a vida teve um objetivo, e o mundo foi precioso demais para a sua pobre – e esforçada irmã!…Ninguém pensa na alegria, ninguém a supõe, nas aparências as coisas velhas são cativantes, e as novas não são reveladas, mas agora não há nada velho, as coisas estão brotando, e florescendo e cantando… (p. 65)

Seja lá o que for que Ben Newton representou para ela como homem, ele certamente deu suporte à sua conexão individualista com a substância colossal da Imortalidade. (…) E então, um choque. Newton contraiu tuberculose em 1851 e então, no dia 4 de junho, ele tomou uma decisão que chocou Emily.

“B.F.N. se casou”, ela anunciou para Austin. Sua esposa era Sarah Warner Rugg, uma mulher 12 anos mais velha do que ele. Como um homem convalescente, ele precisava mais de cuidados constantes do que da empolgação da jovem Emily Dickinson, então aos 20 anos de idade. Ela própria constantemente adoecia também. Estou apenas fazendo suposições. Na verdade, não sabemos nada além do fato de que a conexão com Emily Dickinson existia, que ele “escrevia com frequência” e que o que ele dizia foi formativo para a futura poeta. Ben Newton proferiu frases memoráveis que ficaram gravadas na mente dela. Nove anos após a morte de Newton, ela relembrou com orgulho: “À beira da morte, meu tutor me disse que ele gostaria de viver até que eu me tornasse uma poeta…” Ela deve, então, ter mostrado seus poemas a Newton, embora nenhum deste período tenha sido preservado (apesar de que é possível que ela tenha reescrito alguns quando começou a preservar sua obra no fim da década de 1850). Newton enviou a ela uma mensagem de Worcester na última semana de sua vida. Ela ainda era capaz de citar suas palavras 23 anos depois: “Se eu viver, irei a Amherst – se eu morrer, eu certamente irei.”

O fato de um homem casado pensar em Amherst – isto é, Emily – como seu paraíso confirma o estatuto secreto dela. [Gordon se refere ao poema Title divine—is mine!, que se traduz: “O título divino – é meu! / A Esposa – sem o Sinal!… / Prometida – sem o desmaio / Deus envia a nós, Mulheres -…”] Não podemos ter certeza quanto à experiência biográfica que pode estar por trás deste poema tardio, apenas sabemos que a poeta cultivava este tipo de possessividade e que a mensagem de Newton parece validar a primeira afirmação. Não houve comunicação entre a Sra. Newton e Emily, que parece ter sido surpreendida pela morte de Ben em 23 de março de 1853.

“Ah, Austin, Newton morreu.”, ela escreveu quando a notícia chegou a Amherst, quatro dias depois. (p. 66-67)

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